'/> ·ï¡÷¡ï· V I D A Humana·ï¡÷¡ï·: A violência cristã no Brasil.

julho 29, 2015

A violência cristã no Brasil.

Sem título

Não deve ser um "fato desconhecido" que existe um constante ataque a religião Cristã. Vira e mexe pululam postagens que tem como único objetivo ridicularizar aqueles que a professam. Mas, enquanto alguns defendem essa ideia tendo por base uma natural repulsa à visível manipulação de sentimentos dos fiéis por parte de alguns dirigentes de grupos religiosos, outros apenas nos brindam com um ataque malicioso, por vezes bem articulado, que tenta associar tudo de ruim a mencionada crença. Nesse cenário, eu assumir que sou cristão, serve como uma espécie de comprovação de que eu seja uma pessoa "homofóbica" ou potencialmente "assassina", além de eu ser, obviamente, alguém com algum grave dano neurológico.

A mensagem na foto que abre este texto, faz parte do grupo que tenta associar violência a religião Cristã. Observem que no cenário brasileiro atual é sempre muito difícil ver uma crítica a religião Muçulmana, o que pode nos fazer refletir sobre as intenções reais de quem redigiu a postagem. Ora, se o que motiva a postagem é uma critica a violência provocada pela crença de um individuo, então o campo de análise tem sim de incorporar as religiões, (todas) mas também sistemas sociais e políticos. Tem de tocar tudo aquilo que alguém faça impulsionado por "crença". Clarear o sentido do que se entende por "crença". Avaliar os valores que tal "crença" simboliza ou efetivamente representa. São "virtudes" ou são "vícios"? Em outra oportunidade lancei uma reflexão sobre o mesmo tema (1).

Será que tem algum sentido acreditar que no Brasil há uma direção política a embasar os ataques a religião Cristã? E pode bem ser que tal preferência não se dê por um reconhecimento de valor dos preceitos religiosos, mas por puro e simples reconhecimento de força de influência.

A própria postagem mostra números. Se temos um país com 86,8% de sua população identificada como Cristã (a ampla maioria), temos uma característica conservadora na população. Mas também sabemos que muitas pessoas que se identificam como "fiéis", igualmente se identificam como "não praticantes". Embora possa parecer um mistério como alguém consegue reconhecer verdadeiramente uma virtude e não praticá-la, é fácil perceber que, ao menos em alguns casos, o "não praticante" tem o sentido de que a pessoa não participa dos ritos que o grupo possui, embora procure ter os ensinamentos que reconhece como virtuosos entronizados em seu ser.

Brasil vs Suécia - Sutil comparação.

O que há de "fato desconhecido" na informação da foto que abre este texto?

Vamos comparar as populações dos dois países.

A população da Suécia está estimada em 9,5926 milhões de pessoas. (2) A população Brasileira está estimada em 200,3619 milhões de pessoas. (3) Esses números absolutos são importantes para que possamos avaliar melhor os números percentuais. Notem que o comentário coloca em percentual o número de cristãos no Brasil, mas não coloca em percentual o número de mortes no Brasil, levando igualmente em conta o total da população. Se deveria então, fazer a seguinte pergunta:

- Se num total de 200 milhões de pessoas temos 86,8% da população identificada como cristã, quanto vale percentualmente 56 mil homicídios em 200 milhões de pessoas?

Menos de 0,5% do total!

Então, neste contexto, se colocarmos os homicídios em números percentuais considerando o total da população brasileira tendo em vista o percentual que a foto aponta como sendo o de cristãos no Brasil, o comentário possa ser interpretado ao contrário, e as mortes possam estar associadas, na verdade, a crença ateia ou agnóstica. Se temos uma população majoritariamente cristã, sendo a influencia negativa tão forte como a imagem afirma, o número de mortes teria de ser muito maior para que o argumento fosse válido. O que pode nos levar a considerar que o número de mortes possa estar associado aos grupos não cristãos...

Mas um leitor mais atento poderia argumentar assim: "Você não entendeu a imagem. O que ela significa é que com o monopólio religioso do país, não sobra espaço algum para outras influências!, Logo, não tem sentido reduzir percentualmente a influência cristã nos homicídios que ocorrem no Brasil."

Teria certa lógica a argumentação. Ocorre que com uma influência tão maciça, pode também ser dito que a influência da religião seja visível justamente através do "controle" dos instintos violentos da ampla maioria que a professa. Vale frisar que estamos falando de um grupo com mais de 160 milhões de pessoas, onde a ampla maioria não tem cedido a impulsos violentos segundo a própria imagem!

Quero aqui citar o estudo "Moralidade e homicídio: um estudo sobre a motivação do transgressor" (4), que apresenta reflexões bem oportunas a respeito da influência religiosa naqueles que cometeram um homicídio. É importante considerar que neste momento estou focando apenas na questão religiosa, deixando de lado influências de cunho social, econômico e político. O estudo se propõe a avaliar os motivos alegados por aqueles que cometeram um homicídio, questionando cada uma dessas pessoas sobre como elas avaliam os motivos que as fizeram matar outra pessoa, no momento do ato, e atualmente. A intenção é averiguar se os motivos alegados permaneceram válidos até os dias de hoje. Entre os entrevistados nenhum aponta motivação religiosa para o crime, mas mencionam a influência religiosa como motivadora de arrependimento. Deixo o trecho abaixo, o destaque é meu.

"Por outro lado, notamos que a justificativa 'por causa de motivos religiosos' ocorre somente no presente, pois os entrevistados sugerem ter modificado seu juízo de valor acerca do motivo, justamente por causa de uma experiência religiosa que não possuíam antes do crime. Sabemos da grande inserção de crenças religiosas (variadas) nos presídios, o que ocasiona para muitos internos uma possibilidade de se vincularem a alguma delas e de seguirem os seus ensinamentos após a liberdade condicional. Por esse tipo de justificativa, podemos pensar que, mesmo não tendo havido perdas para aqueles que cometeram o crime de homicídio, uma parcela deles poderia ainda ter modificado seu juízo de valor acerca do motivo que teve, em função de uma escolha religiosa, que os faria perceber diferentemente o que fizeram, passado esse período de tempo. Diante dessa discussão vemos a necessidade de outras pesquisas que possam abordar especificamente essa possível relação entre a religião e o juízo de valor moral".

Embora o estudo não afirme que a religião seja suficiente para impedir que uma reincidência (prática de outro homicídio) aconteça, deixa claro que os entrevistados não eram fiéis antes do homicídio. Só por essa informação eu já teria base para ligar os crimes ao ateísmo se eu acaso quisesse copiar o estilo de quem postou a foto. Entre os entrevistados 20% dos que cometeram crimes e se arrependeram justificaram o arrependimento por motivos religiosos.

Mas seguir nessa linha de interpretação não é o correto, na verdade, é uma pegadinha, uma armadilha para desviar o foco. O truque está em colocar a informação de tal modo que de a impressão de que todos os homicídios no Brasil são efeitos da religião cristã ou da religião em geral. E aí vão seguir as argumentações sobre a influência da religião no individuo e seu papel na sociedade. Discussões sem fim que praticamente não tocam na intenção real desse tipo de informação.

É obvio que não estou afirmando que tal ou qual grupo religioso tenha relação direta com a quantidade de homicídios, proponho, a princípio, uma reflexão sobre a influência da religião, mas apenas com a intenção de demonstrar que  mesmo nessa base a informação não tem sentido. Em segundo lugar quero chamar a atenção para outras possíveis influências ao aumento da violência.

A violência. Um pouco além da religião.

Uma coisa que aprendemos em cursos de gestão é que o melhor modo de avaliar uma situação é por números percentuais, todo o restante deturpa a realidade. Provavelmente quem redigiu a notícia sabe disso, e sabe que se colocasse no texto em percentual o número de homicídios para tentar uma crítica a religião cristã, seu argumento seria ridículo, por isso em parte ele indica números percentuais, e em parte ele dá números absolutos. 56 mil causa um impacto mais forte do que menos de 0,5%. (0,028%)  IOFU6gE

Não é nada inocente deixar de lado os estudos apresentados na série o Mapa da Violência (5) e nem sequer tentar correlacionar a situação econômica e política do Brasil com o aumento da violência em geral. O comentário faz de conta que o fato de a Suécia ter um PIB Per Capita 60.430,22 USD contra um PIB Per Capita de 11.208,08 USD ‎ no Brasil, não influencia em nada. Você sabe como é, o problema é a religião e não a economia ou sequer a política.

No estudo anteriormente mencionado é feita uma citação que ajuda a entender o jogo de palavras que tenta jogar sobre a religião a responsabilidade da violência no Brasil. (4)

"Assim, Chauí (1980) e Velho (1996a), não justificam a violência como consequência do estado de empobrecimento da população, mas vinculam-na à perda de referenciais éticos, própria de um novo modus vivendi, própria de uma época social dita pós-moderna."

Notou que para pessoas do tipo de Chauí o "estado de empobrecimento da população" em nada contribui para o aumento da violência? Ela nem considera que a perda de referências éticas possa se dar justamente pelo aumento das dificuldades do cidadão em satisfazer suas necessidades mais básicas.

Nas palavras dela "a situação atual é apresentada como favorável à criminalidade e a transgressão porque as regras, normas e leis perderam sua eficácia como cimento efetivo, moral e legal das relações sociais". (6) É bom lembrar que o artigo dela foi escrito em 1980, mas está incrivelmente atual.

Agora, nesse cenário, não ficaria estranho dizer que "as regras, normas e leis que funcionam como cimento moral das relações sociais" e que mantém a maior parte da população não violenta, provém também da religião?

Outro "fato desconhecido", é que as regiões que mais recebem benefícios assistências do governo federal estão entre as mais violentas do país. E nem se diga que os benefícios são direcionadas à elas como forma de coibir a violência, pois o que ocorre é que a medida que os benefícios aumentam a violência aumenta junto! Basta ver a série de estudos Mapa da Violência. Agora se pode perguntar se esse é um dado com maior ou com menor relevância do que a religião do indivíduo?

Outro ponto é a união do governo federal através do Foro de São Paulo com o maior grupo de narcotraficantes das Américas, as FARC. Esse fato é um dado com maior ou menor relevância do que a religião do indivíduo? E o consumo de drogas no Brasil, que aumenta enquanto no resto do mundo diminui? Não é um mistério quando se leva em conta a já mencionada parceria do governo federal com grupos de narcotraficantes, e também não é nenhum "fato desconhecido" que trafico e violência estão inter-relacionados.

Sem considerarmos a questão do porte de armas na Suécia que é de 31,6 armas por 100 habitantes (7), enquanto no Brasil se luta para desarmar a população (20); sem considerar que de forma estranha no Brasil jovens com 16 anos são imaturos para assumirem seus crimes, enquanto (8) jovens com 12 anos são considerados maduros para decidir sua vida sexual (9), se poderia questionar a razão de o governo brasileiro estar fechando escolas e abrindo presídios (10,11). Será que esse fato tem maior ou menor relevância que a religião do individuo?

Entretanto, aqui com meus botões, considero que um ponto que pode também estar contribuindo para o fechamento de prisões é alguma alteração no modo como as penas possam estar sendo aplicadas. Talvez o foco em reabilitação de prisioneiros ou sentenças alternativas para crimes relacionados a drogas tenha alguma influencia na quantidade de presos, o que não significa que os crimes tenham cessado. É importante considerar o quanto tem crescido a tendência a "relativização" na aplicação das leis.

Outro fato que parece conhecido, é que um país que ocupa o 79º lugar no ranking do IDH (12) deve ter políticas efetivas que melhorem o sistema educacional e coíbam efetivamente os crimes. Se não temos isso, então é a religião que leva a culpa?

E no caso brasileiro é bom refletir também sobre o sistema educacional vigente. Pensar sobre causas e efeitos. Será que mesmo Paulo Freire sendo declarado Patrono da Educação no Brasil, a influência não apenas de suas ideias, mas de todo o pensamento sócio-construtivista tem mesmo ajudado o país? (13) E ainda que a ONU tenha feito declarações a favor de Paulo Freire (14), um fato conhecido é a persistência do Brasil sempre entre os piores do mundo no quesito educação. (15,16,17,18,19) Seria realmente tão sem sentido relacionar entre as causas da má qualidade da educação no Brasil o método vigente?

Quando notamos o desleixo no quesito educação, conseguimos entender como alguém defende a ideia da foto lá no início da postagem. A pessoa não aprendeu a contextualizar uma informação. Não consegue mais encadear racionalmente o que seja causa e seus possíveis efeitos, tampouco as implicações de uma ideia que se propõe livremente a defender. Isso, é claro, supondo que ela (a pessoa) ao menos esteja sendo um pouco honesta com relação aquilo que escreveu, e não apenas uma agente de propaganda a serviço de uma ideologia que nem compreende.

Allan Roberto Regis.

Referências.

 
 
 
 
2011capitais
 
 
 
2012

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